Ele me beija e eu sinto meu coração bater mais forte,
enquanto peço a Deus pra parar com isso, porque não quero gostar dele. Ele deve
dar uma risada gostosa quando escuta essa minha oração, porque escuto o
sussurro de "É tarde demais, minha filha" cada vez que meu corpo
inteiro se arrepia com o toque dele.
Ele me bagunça por dentro e eu desajeitadamente vou indo
atrás tentando botar tudo no lugar. O espertinho foi se instalando devagarzinho
igual parente distante. Foi ficando, foi ficando e quando dei por mim, ele já
tava lá, se sentindo em casa e deixando tudo como queria. E eu, impotente, só
pude olhar enquanto ele mudava tudo e no fim até achei que tava bom.
As ausências passaram a ser dolorosas. Parece que o tempo se
encarregou de passar mais devagar só pra me matar de ansiedade e me deixar
frustrada por ser tão ocupada. Mas cada segundo da companhia dele, mesmo que
curtos demais pro meu gosto, valem a pena. Ele me faz até ter ciúmes, acredita?
Isso é uma coisa surreal na minha existência. Pensar que talvez a companhia de
outro alguém seja melhor que a minha me tira o fôlego e faz meu peito ficar
pequeno demais com a agonia do pensamento.
Os dias - mesmo raros - sem notícias me entristecem.
Percebo que me preocupar com você virou rotina e que não tenho sossego enquanto
não tenho certeza que tá tudo bem. Sei lá, a gente se fala tanto que já
acostumei. Não enche o saco, não é cansativo. Só parece que a gente faz isso há
anos e que é normal pelo menos passar pra dizer um oi.
Enquanto ele bagunça o meu cabelo, brinca sobre os filhos
que nem sabemos se vamos ter juntos. Ele descreve um time de vôlei, enquanto eu
penso na gritaria que seria a casa, mas na alegria que resultaria essa casa
lotada. Ele fala no meu ouvido sobre dormir e acordar do meu lado e eu penso se
ele vai me aguentar o suficiente pra gente fazer isso juntos. Ele me conta da
vontade de ter uma casa com quintal e uma rede na varanda pra nós dois e tudo
que eu consigo fazer é suspirar e pedir aos céus pra que possa dar certo.
Penso em nós dois e só consigo sorrir. Me sinto leve e acho
que a gente até pode dar certo e nem é só pelo pensamento que combina e o corpo
que se encaixa. Você me dá vontade de remar por nós dois e se o barco afundar,
de nadar junto até nosso porto seguro. Sei que se a gente se esforçar, tudo vai
ficar bem.
Espero a gargalhada de Deus cessar, enquanto os braços dele
enroscam na minha cintura e meus olhos se fecham para mais uma prece. Que dure
e que tenha amor, eu peço à Ele. E ele me responde: "Isso é com vocês,
minha filha".
Thalyne Carneiro